Para responder as questões apresentadas no Texto 1 sobre os comportamentos violentos e o que é violência, entendo que a CNV se baseia em um conceito fundamental. Esse é um elencamento pessoal: ao aprender sobre CNV com Dominic Barter (instrutor credenciado do CNVC que atua no Brasil), me pareceu que todo esse campo de conhecimento gira em torno do entendimento do que é ser humano que o conceito de Valor traz. E então que tudo o mais na CNV gira em torno desse entendimento – e da empatia como prática.
A idéia primordial é a de que a Vida passa pelos seres humanos através dos Valores (que também podem ser entendido como Necessidades ou Princípios). Ou melhor: que eles são a expressão da Vida através da gente. Nunca um Valor está ou não está; essa não é uma lógica mecanicista. Antes, é uma lógica agricultural, ou mesmo orgânica: um valor cresce, florescendo; ou então diminui, no sentido de seu fenecimento. Nos sentimos vivos quando um de nossos Valores pode crescer em expressão no mundo. Outra forma de dize-lo é que estamos vivos na medida que nossos Valores crescem em expressão no mundo. Ou ainda, ao conseguirmos ir no sentido da expressão de um Valor, nos abrimos para a Vida, no que ela tem de mais profundamente maravilhosa.
Um Valor é aquilo que uma pessoa valoriza profundamente. Outras formas de chamá-lo são: Princípio (aquilo que vem primeiro); e Necessidade (de acordo com a raiz da palavra, aquilo que não cessa; não cessa de vir à tona, como um pedido de atenção).
As formas que damos para tentar expressar um Valor no mundo são estratégias. E uma idéia crucial da CNV é a de que nunca há somente uma única estratégia para que um Valor ganhe expressão. Isso é muito importante, porque, se nos focamos nas estratégias, podemos nos ver sem conseguir resolver uma situação. As estratégias podem, afinal de contas, estarem colocadas contra outras estratégias (como alguém tentando expressar sua necessidade de segurança fazendo chantagem emocional com outra pessoa). Assim, o resultado será que elas estarão colocadas contra outras Necessidades. Mas somente porque as estratégias são conflitantes; ou se está muito fixado nelas. Falaremos mais sobre isso quando mergulharmos mais profundamente na questão dos conflitos.
O outro ponto de importância dessa idéia é entender que um Valor não tem nenhuma manifestação específica. Não existe uma manifestação específica para a liberdade, por exemplo. Existem inúmeras maneiras de expressão dela, inúmeras formas, arranjos sociais, comportamentos, que favorecerão a liberdade de algumas pessoas. Tanto isso me parece verdade quanto uma estratégia de expressão de um Valor pode estar fazendo com que esse mesmo Valor seja diminuído em outra pessoa. E esse é o problema de nos focarmos nas estratégias sem identificarmos o Valor que ela tenta expressar.
Desse ponto vem a compreensão de que os Valores são universais. Eles são compartilhados por todos os seres humanos. Suas manifestações é que são específicas de cada ser em cada momento, assim como, é claro, a sensação que pode ter cada pessoa (tal como expressa a frase “a minha liberdade”).
Quando eu estava tendo minhas aulas de CNV, uma colega levantou a mão frente a essa explicação e perguntou a respeito dos “valores negativos”, tais como ganância, cobiça, arrogância, vaidade etc. Sua questão era a respeito das pessoas que valorizariam tais coisas.
O apontamento de Dominic foi preciso: se pensarmos uma pessoa, ao invés de uma generalidade, o que é a ganância, por exemplo, para essa pessoa? Quer dizer, afinal de contas, por que alguém parece valorizar a ganância?
Se formos adiante nessa linha de pensamento, iremos criando uma série de possibilidades a respeito do que é essa dita ganância. Algo que se expressa como ganância pode vir da necessidade de bem-estar, por exemplo. E assim, “ganância”, como um Valor, não existe. Ela existe apenas como uma idéia, um julgamento que fazemos de alguém; e/ou como estratégia. Nesse caso, o que pode acontecer é que isso que chamamos de comportamento ganancioso pode estar sendo a expressão trágica de um Valor genuíno.
Isso é verdade para qualquer dito “valor negativo”. E também é verdade que as palavras são problemáticas enquanto definições. Vale a pena entendermos que uma definição serve apenas para uma coisa morta, uma coisa sem movimento. Para uma coisa viva, uma definição será sempre parcial, e portanto problemática se a entendermos absolutamente. Quanto aos seres humanos, uma definição é um atalho. Eu posso dizer “eu sou professor”, por exemplo, e com isso estar tomando um atalho ao invés de dizer “eu passo boa tarde do meu tempo compartilhando conhecimentos com outras pessoas em reuniões agendadas para as quais sou remunerado, ou não”. No entanto, se eu entendo a afirmação “eu sou professor” não apenas como um atalho, mas como uma explicação estática do que eu sou... se eu me identifico com essa afirmação completamente, terei automaticamente um problema grave, porque não só ela é parcial como aprisiona toda as outras possibilidades que eu tenho enquanto ser humano. E aprisiona as possibilidades de eu estar me comunicando de forma a me aproximar das pessoas, ou seja, para além de definições, naquilo que estaremos criando juntos.
Digo isso nesse momento porque o que chamamos como o “valor negativo” da vaidade, para dar outro exemplo, pode ser entendido de diferentes maneiras. Se por “vaidade” entendemos o comportamento de prestar atenção à própria aparência como forma de adquirir segurança através da auto-estima, em primeiro lugar ela é uma estratégia, não um Valor. E em segundo não parece ser “negativa”. É só uma estratégia. E por vezes trará problemas, causando a diminuição de outros Valores da própria pessoa ou de outras pessoas, enquanto outras vezes será capaz de simplesmente expressar esse Valor de segurança, ou seja qual for o(s) Valor(es) relacionado(s).
E, falando a respeito da expressão trágica de um Valor genuíno, acredito que acabo de dar a resposta para as nossas perguntas sobre violência. Um Valor, afinal, pode crescer, quando há sucesso em sua expressão no mundo. Pode, também, diminuir, quando não conseguimos expressá-lo, ou devemos contê-lo por algum motivo, ou ainda o comportamento de outras pessoas nos afeta no sentido de seu fenecimento. Mas é bastante comum que tentemos expressar esse Valor de uma forma ou de outra. Que procuremos um jeito de vivermos, ou até sobrevivermos. Assim, muitas vezes escolhemos agir de uma forma que gera uma violência contra outra pessoa, contra nós mesmos, ou ambos. Esse ato, no entanto, não é nada mais nem nada menos do que a expressão trágica de um Valor genuíno.
Por trágica, não intenciono diminuir o peso da violência. Apenas quero entendê-la de forma a podermos lidar com ela. O caminho da CNV é sempre procurar perceber o ser humano atrás de cada ato. Ao mesmo tempo não é diminuir a importância dos atos. Há, o tempo todo, atuações absolutamente trágicas no mundo, atuações realmente monstruosas. E devemos lidar com elas da melhor forma possível. A CNV é uma tentativa de fazê-lo. E começa entendendo que alguém que exerce uma atuação monstruosa não é um monstro, mas uma pessoa que fez algo monstruoso.
Essa importante mudança de foco do nosso entendimento também deverá ser capaz de nos proteger quanto aos atos e palavras dos outros. Mas veremos mais sobre isso em seguida. Como também discutiremos mais a respeito dos quatro passos da CNV, que são:
- a Observação sem julgamentos;
- os Sentimentos;
- as Necessidades (ou Valores);
- o Pedido.
No entanto, nesse momento, sugiro um exercício bastante simples para compartilharmos entendimentos a respeito do que são os Valores. Esse será nosso Exercício 2. Também através do Fórum desse Exercício podemos conversar a respeito de dúvidas nesse texto.
E deixem-me expressar o quão bom eu acho vocês estarem aqui conosco! :]
Se você ainda não tiver se cadastrado no Fórum, pode fazer isso aqui. Nesse caso, pode também querer dar uma passada no Fórum sobre nossos Acordos de Convivência.
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